Homenagem


Inauguração da Unidade de Educação Infantil Professor Jorge Najjar









A obra estava finalmente concluída na região da Vila Ipiranga, no bairro do Fonseca em Niterói (RJ). O dia27 de março de 2013 estava claro e intensamente azul. Não esqueço que subi a pé um trecho da comunidade, era mais fácil e possibilitava observara paisagem. Sobressaia aos meus olhos uma realidade tão diversa e desigual, distante das regiões consideradas nobres e, por isso, desconhecida de muitos, mas ressentida pela prolongada ausência do estado. Niterói sempre precisou da ampliação da escola pública, da consolidação de políticas educacionais voltadas para inclusão e melhoria do nível de escolaridade da população. Em meio a pensamentos sobre o lugar da educação pública, uma grande alegria me invadia. Ao participar da entrega da Unidade de Educação Infantil Professora Marilza da Conceição Medina naquela localidade, refletia sobre o sentido da práxis e a necessidade de política públicas militantes construídas com e para as comunidades.

Jorge Najjar
Jorge Najjar

A festa de inauguração evidenciava animação, contentamento, assim como ansiedade por parte dos presentes. Mães diligentes esperavam na porta para saber quando seria a matrícula e qual a faixa etária atendida. Lideranças comunitárias exaltavam as possibilidades e esperanças na nova escola. Ao chegar, tantas crianças corriam e, no meio de tantos abraços que recebia, compreendia a responsabilidade social e a importância de nosso trabalho.

Na sequência, se seguiu um grande esforço, um trabalho de equipe que, ao longo de oito anos, possibilitou implantar mais 22 unidades de educação infantil no âmbito do programa denominado Mais Infância. Além das metas previstas no Plano Nacional de Educação, existia a preocupação com a democratização do acesso, com a qualificação dos profissionais e com diversas dimensões que deveriam compor uma política pública educacional que, entre seus objetivos, tinha muito mais que construção de novos prédios. O desafio estava inserido na agenda governamental, mas era preciso avançar na compreensão, na escuta dos atores, na delimitação de prioridades e estratégias de ação.


Foto de sala da Escola

O planejamento do Programa Mais Infância envolveu muitas etapas, compromissos, sensibilidade política e a formulação de diagnóstico georreferenciado que identificou em áreas de baixo IDH a demanda por matrículas na educação infantil. Sem dúvida, existiam vazios, era preciso, portanto, mais escolas, mais educação e atendimento de qualidade. A ideia era expandir a educação integral em tempo integral, confiando o trabalho a dois professores por classe, oferecendo tudo aquilo e muito mais que a gente pudesse oferecer.

Na época das inaugurações sempre debatíamos, procurando um patrono que pudesse o motivar o trabalho e o projeto pedagógico da futura escola. Discutia-se muito: a escola deveria ter o nome poeta, de um literato ou de um educador? Sempre me ocorria que centelhas de entusiasmo poderiam ser lançadas, suscitando a produção de excelentes ideias e o entusiasmo nos profissionais. Afinal, educação se faz também com o coração, emoção, empatia e com sonhos que podem alimentar práticas e a persecução de novos horizontes.

O final de um ciclo se aproximava e uma última unidade ficava pronta. A pandemia nos assolava no ano de 2020, impondo medo e restrições. Num contexto tão difícil, o Professor Titular Jorge Najjar da Faculdade de Educação (FEUFF) nos abandonou. Conheci Jorge quando ingressei na FEUFF. Logo, logo, o interesse por determinadas temáticas nos aproximou. Sempre atento à construção da gestão democrática, à formação dos profissionais da educação, Najjar participava de diversos fóruns, conselhos, conferências. Sua presença calorosa era querida e sua produção acadêmica apropriada e debatida por educadores em diversos municípios. Não preciso lembrar da qualidade de seus trabalhos e de seu alto desempenho como pesquisador. Prefiro lembrar de nossos debates sobre abandono escolar, de nossas reflexões sobre a necessidade de democratizar o acesso à educação, das pesquisas que desenvolvemos e compartilhamos, de seu lado profundamente amigo.


Placa da Inauguração

Mais do que um compromisso político e defesa de uma educação transformadora e humanizadora, Jorge nos deixou, ao lado de um vazio, um exemplo de educador dialógico e . Assim, nada mais pertinente, considerando sua potência intelectual e importância para educação municipal, que colocar seu nome em uma nova escola, homenageando-o. A unidade, com uma vista linda e impactante, é localizada no Capim Melado, bairro de Ititioca, em Niteroi (RJ). Em sua entrada, há uma foto do Professor Jorge Najjar que parece saudar as crianças, irradiando a energia de seu sorriso. Sempre que falo em meu grande amigo, me comovo com tantas saudades, mas lembro do que Paulo Freire destaca: “enquanto eu luto, sou movido pela esperança; e se eu lutar com esperança, posso esperar.”

Salve a Unidade de Educação Infantil Professor Jorge Najjar!






Professora Maria Emilia de Castro Rodrigues! Presente!



Uma mensagem que expressa indignação, dor, reconhecimento e saudade!









Quando colegas da Revista Educação Básica em Foco me procuraram para escrever esta homenagem, havia passado apenas dois dias da morte da companheira Emilia. Não consegui fazê-lo. Ela morreu na noite do dia 08/03 e hoje, passados dez dias, é mais uma na estatística dos mais de 10.000 mortos em Goiás pela Covid-19 e quase 300.000 mortos no Brasil. Diante da realidade brasileira e, em respeito a memória de quem tanto lutou pela educação pública, não posso começar de outra forma esta homenagem que não seja manifestando toda nossa indignação por tantas vidas perdidas, por tanto sofrimento que estamos vivendo, que poderiam ter sido evitados, se não tivéssemos à frente do governo deste país e de tantos estados da federação, políticos que investem todos os dias na desinformação, na negação das evidências científicas, na implementação de medidas que, gastando muitos recursos públicos, só tem contribuído para colocar o Brasil como epicentro da Pandemia de Covid-19.

Emília

Profa. Maria Emilia de Castro Rodrigues

É uma dor que segue no seio de toda família de Emilia, principalmente do marido, duas filhas e duas netas, e que se estende a muitos colegas e companheiros com quem, ao longo de mais de 30 anos, atuou no magistério público e, principalmente, na militância do movimento dos Fóruns de EJA do Brasil. Essa dor, que se expressa nestes primeiros dias em luto, precisa ser canalizada em luta. Emilia, por sua origem xavante, sempre teve uma postura muito firme nas pautas que defendia, cabe a nós intensificarmos nossa defesa do direito à vida, que é de fato o bem mais precioso que temos.

Para as pessoas que não conheceram a professora Maria Emilia de Castro Rodrigues, Emilia sem acento… como ela sempre alertava, ela morre aos 56 anos, ainda em plena atividade acadêmica, mesmo já tendo aposentado como professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, onde atuava no Curso de Pedagogia desde 1996. Antes de ser professora universitária, atuou como professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental na rede estadual de educação em Goiás e da rede municipal de educação de Goiânia. Esta experiência na educação básica é que a leva a procurar o Curso de Pedagogia, para sua formação em nível de graduação, e diversas especializações com ênfase nas temáticas sobre alfabetização. Antes de ser concursada da UFG em Goiânia, atuou como professora no interior de Goiás, na cidade de Jataí, sempre como formadora de professores.

Tive a oportunidade de trabalhar com Emilia desde 1996 na Faculdade de Educação. Fomos companheiras, primeiramente, de projetos de extensão voltados para a formação de educadores populares, que atuavam em programa de alfabetização de jovens e adultos da rede municipal de Goiânia. No final dos anos 1990 já estávamos juntas em projetos de pesquisa, voltados para compreender os aspectos políticos e pedagógicos da educação de jovens e adultos, especialmente nas iniciativas inovadoras que a rede municipal de Goiânia vinha implementando. Destas pesquisas resultaram nossas dissertações de mestrado. Desta atuação conjunta na extensão e nas pesquisas, partimos para defesa de disciplina específica de EJA no currículo do Curso de Pedagogia, bem como abordagem adequada à modalidade nos demais componentes curriculares, que considerassem o Pedagogo como o profissional que atuaria na educação de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Alcançamos um espaço para estas disciplinas, como Núcleo Livre, na reforma do curso, a partir de 2003 e, na reforma de 2017, estas disciplinas passaram para o Núcleo Optativo. Grandes batalhas, pequenas vitórias, mas que representaram muito na conquista de um lugar para a temática da EJA dentro da UFG e fora da UFG.

Emilia foi uma das fundadoras do Fórum Goiano de EJA, nos anos 2000, movimento que se destaca na defesa do direito a educação de todos e todas, em Goiás, e que faz parte da rede nacional dos Fóruns de EJA. Foi a principal responsável pela manutenção do portal deste Fórum, que reúne um conjunto significativo de fontes de história e memória da EJA do Estado de Goiás, que pode ser acessado pelo link: http://forumeja.org.br/go/ Por sua longa trajetória no campo da didática e prática de ensino, preocupava-se incansavelmente com a formação inicial e continuada de professores, isto é perceptível na sua produção acadêmica. Na pós-graduação sempre ministrou a disciplina com foco na biografia e nas obras de Paulo Freire, destacando sua importância e a defesa de uma concepção de educação emancipatória.

É com imensa saudade da risada alta e prolongada que ocupava os corredores da FE/UFG, dos encantadores cartões produzidos por suas mãos de artesã, das suculentas que nasciam dos seus “dedinhos verdes”, mas sobretudo da generosidade e do cuidado com que tratava a cada um sem distinção, que nos despedimos desta valorosa companheira. Fica entre nós o compromisso de seguirmos na luta, contando com ela em outro plano de existência.

Goiânia, 18 de março de 2021

Maria Margarida Machado
Professora da FE/UFG e membro do Fórum Goiano de EJA




Obs. As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade das autoras


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